Mesmo com aumento do risco no cenário internacional, Copom deve manter ritmo no corte dos juros

Mesmo com aumento do risco no cenário internacional, Copom deve manter ritmo no corte dos juros

Economia

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central se reúne na próxima terça, 31, e quarta-feira, 1º, para definir o rumo da taxa básica de juros. No último encontro, o colegiado optou pela segunda redução seguida de 0,5 ponto percentual da Selic, após um período sete manutenções consecutivas. Representantes da autoridade monetária declararam que órgão deve manter o ritmo de cortes nas próximas reuniões. Contudo, o conflito bélico entre Israel e Hamas, iniciado em 7 de outubro, gerou um clima de incerteza, principalmente em relação aos impactos econômicos que um escalonamento do embate pode gerar em todo o mundo. Especialistas consideram que o cenário aumenta a possibilidade de que o Banco Central diminuía o ritmo de cortes na taxa básica de juros pela deterioração do cenário internacional. Contudo, analistas consultados pela Jovem Pan preveem que a autoridade monetária brasileira mantenha a trajetória da redução da Selic para não comprometer os benefícios do aperto monetário realizado até recentemente.

Essa é a aposta de Bruna Rizzolo, consultora de Economia da BMJ Consultores Associados. Ela pondera que a decisão de manter o nível de cortes deve se basear na perspectiva de inflação para 2023, que atualmente encontra-se abaixo do teto da meta e na redução observada na atividade econômica em agosto. “Ademais, o novo corte também deve levar em consideração o avanço da pauta econômica no Congresso e a busca pelo déficit zero pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Em relação aos conflitos internacionais no momento, existem duas preocupações. A primeira é o aumento no preço do petróleo, tendo em vista a participação do Oriente Médio na produção do insumo. Uma possível expansão do conflito para os demais países da região tende a reduzir a oferta do bem, elevando seu preço internacional e resultando em altas nas inflações domésticas. A segunda é a consequência do prolongamento do conflito na política monetária dos Estados Unidos”, indica.

Rizzolo esclarece que um possível aumento dos gastos fiscais do governo norte-americano para apoiar Israel pode pressionar o Federal Reserve, Banco Central do país, a manter sua taxa de juros elevada por mais tempo, ou até mesmo realizar novos aumentos. “Maiores juros nos Estados Unidos podem resultar na fuga de capitais de países em desenvolvimento, o que poderia pressionar a inflação brasileira, ao desvalorizar a moeda nacional e levar à revisão da atual política monetária do Copom para uma redução de menor magnitude nas próximas reuniões do grupo”, observa.

O economista-chefe da Constância Investimentos, Alexandre Lohmann, também considera que o Copom deve manter o ritmo de cortes. “Desde a última reunião, o aumento das taxas de juros nos Estados Unidos limitou o espaço para um corte maior (de 0,75%). O Copom preferiu adotar uma postura cautelosa para evitar que uma redução rápida do diferencial de juros resultasse em uma desvalorização excessiva da moeda. O comportamento estável do câmbio desde a última reunião e o desempenho benigno da inflação corrente — com previsão do IPCA 2024/2025 ainda ao redor da meta — não requere uma redução ritmo de corte enquanto a Selic permanecer acima de 10%. Acreditamos que o Copom deve manter o ritmo de corte nas próximas reuniões”, avalia.

Principais preocupações e riscos 

Lohmann ainda aponta a decisão do governo de, já na primeira reunião de 2023, substituir os dois diretores com tendências mais “hawkish” [a favor do combate à inflação por meio do aumento dos juros]. Com isso, a gestão de Lula assegurou uma maioria de diretores alinhados com a política do governo e contribuindo para a manutenção do ritmo de corte no início do ano. O analista pontua ainda que, em relação ao conflito no Oriente Médio, existe um risco de aumento da inflação via preços da energia. Contudo, este risco ainda é limitado agora.

Matheus Pizzani, economista da CM Capital, complementa que a principal preocupação é o possível impacto da extensão das questões geopolíticas para o campo da economia via preço do barril de petróleo, o que automaticamente afetaria a inflação de combustíveis e energia. Ele avalia que isso comprometeria os benefícios do aperto monetário feito até aqui e possivelmente demandando juros elevados por mais tempo. “Apesar da turbulência no mercado internacional atualmente, vemos que a trajetória recente da inflação proporcionam ambiente propício para manutenção do atual patamar de cortes. A inflação vem dando sólidos sinais de arrefecimento especialmente em seus componentes efetivamente sensíveis à política monetária, assim como a melhora das expectativas dos agentes de mercado e o arrefecimento da atividade econômica, que melhora a perspectiva da trajetória de inflação futura”, considera.

Ele afirma que, apesar de não ser um impeditivo para manutenção da redução da Selic, o cenário externo se mostra adverso o suficiente para evitar o aumento da magnitude dos cortes praticados daqui em diante. “Especialmente por conta dos possíveis efeitos de uma fuga de capitais do país e os efeitos negativos que isto pode ter sobre a dinâmica da inflação doméstica. Não enxergamos espaço também para redução no ritmo de cortes, uma vez que, além de não afetar o processo de desinflação por conta da defasagem da política monetária, pode acabar provocando um desaquecimento mais intenso que o desejado da atividade econômica”, pondera Pizzani.

Perspectivas para o comunicado e próximos encontros

Economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung estima que, em relação à reunião de setembro, a expectativa é de que não haja grandes alterações no comunicado. “O cenário doméstico não alterou de forma relevante nos últimos meses. Por exemplo, a atividade econômica continua dando sinais de desaceleração como o esperado pelo Banco Central. Além disso, o mercado de crédito segue arrefecendo, e a inflação segue benigna. O principal ponto de atenção da autoridade monetária é a trajetória da inflação. A boa notícia é que os últimos dados mostram preços mais controlados. O IPCA-15 divulgado na semana passada corrobora essa visão. O índice registrou uma alta de 0,21% em outubro, dentro das expectativas do mercado. Nos últimos 12 meses, ele acumula uma alta de 5,05%, levemente acima dos 5% registrados em setembro deste ano. Para o segundo semestre, a inflação tende arrefecer e terminar o ano dentro da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN)”, explica.

Contudo, o analista pontua que as incertezas no cenário externo e o risco fiscal brasileiro deverão ser enfatizados pelo Comitê, com ênfase na taxa de juros dos EUA e os conflitos no Oriente Médio. “Entre setembro e outubro, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sinalizou em palestras e entrevistas a importância de se buscar a meta fiscal de 2024 e não a abandonar. Um compromisso do governo e dos parlamentares poderá melhorar as expectativas sobre a economia e facilitar o trabalho do Copom. Além disso, os conflitos que o mundo observa hoje — no Oriente Média e na Ucrânia — podem manter os preços do barril de petróleo e de outras commodities em níveis elevados por mais tempo, o que tenderia a exercer pressões inflacionárias e dificultar o trabalho dos Bancos Centrais pelo mundo. Esse cenário forçaria as autoridades a manterem as taxas de juros elevadas por mais tempo”, indica.

O economista considera que, mesmo com as incertezas citadas acima, há espaço para queda da taxa Selic dado o cenário inflacionário brasileiro positivo. Ele estima que na próxima reunião haja um corte na taxa de juros de 0,50 ponto percentual, levando a Selic para 12,25% ao ano. Para 2023, a projeção para a taxa terminal da Selic é de 11,75% a.a. Já para 2024, a expectativa é que os juros terminem o ano em 9,75% a.a.

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